Eu moro numa casa abandonada por quem morava antes Agora é minha morada Eu tenho um carro velho e uma linda namorada Trabalho de empregado e tenho uma empresa de fachada O tênis que eu tenho eu herdei do meu cunhado Última vez que eu comprei roupa acho que foi ano passado Mas eu não sou mendigo, truta, só meio largado Não sou materialista, vivo bem desapegado Na escola a professora disse que eu era retardado Me chamou de babuíno, tipo, eu fui discriminado Mas nem por isso hoje eu me faço vitmizado Eu quero mais fazer meu corre sem depender do Estado Só não vem dizer que eu tenho a chance desses arrombado Que o pai paga a facul, o apê e a gasosa do carro Mesada pra birita no role universitário Pra meter a napa no espelho com os zóio arregalado Escarro quando esbarro esse tipo de otário Que julga o que eu tenho e não sabe o que eu valho Mas não tô a venda, eu não valho Nada é páreo para um preto revoltado com o sistema segregado E que rouba a cena, pique revolucionário a pé ou de Palio Na entrada do posto uma vez eu fui barrado Na entrada do buso outra vez fui revistado Em qualquer loja que entro, sou muito bem vigiado Estou sempre sorrindo, pois estou sendo filmado Por algum segurança sempre estou acompanhado A ironia é que ele é preto igual eu e tatuado Mas a ideologia muda quando o cara 'tá fardado E de colete e escopeta altera o tom pra autoritário Pobres fardados falidos que me julgam pelo estereótipo Por que pensam que todo preto e pobre é bandido? E quando a brisa loka passa, e a espuma branca cessa E o papo desenrola, o PM baixa a bola Vê que eu sou de boa, e me manda embora Me faz gastar sola à toa, sempre desentoa Minha sorte é que Deus sempre me abençoa Pois se não fosse a minha simpatia Minha cabeça logo rolaria pelas galerias do insta De androids e iphones da vida Mais um inocente confundido com bandido A noite todo gato é pardo Quem é preto tá fodido Cuidamos dos seus filhos Trocamos os seus velhos Lotamos cemitérios Mortos por seus critérios Limpamos escritórios Ouvimos seus escárnios Varremos suas escolas Nos deixam sem escolhas Calos nas mãos e bolhas Cozinho seu cardápio Limpamos teu carpete Tosamos o seu Pet Enchemos tuas taças Varremos suas praças Onde jogam migalhas Podam as nossas asas Lesam as nossas almas Desapropriam casas Nos doam cesta básica E filmam, pois acham graça De divulgar a desgraça Choro tanto, me escorre o pranto Penso e fico tenso ao ver que tô propenso Ao racismo, e o descaso, me faço alvo fácil Mesmo sendo dócil, amigo, amável Nada é estável, nada é favorável Pra quem vem de onde eu venho É mimimi pra quem tem o que eu não tenho E não é descriminado Quem não leva enquadro Quem não é enquadrado Quem pensa quadrado No compasso e esquadro Pra manter o status De agente do Estado Mano eu tô de boa Eu só tô preocupado Veja o nosso estado Fomos massacrados Ainda somo escravos Entre rosas, espinhos e cravos Estacas no peito eu cravo Dizem que é velado, mas eu escancaro De frente eu encaro o que me custa caro Minha pele é minha sina e assino embaixo Aquele que esculacha e não aguenta o esculacho Então sai de baixo Eu não me encaixo A situação é grave como um contrabaixo Só não chuta que é macumba Então respeita esse despacho