Os avós eram de carne e osso. Tomavam mate, comiam carne com farinha, campereavam. Sopravam a chama dos lampiões, dormiam cedo. Os avós tinham braços e pernas e cabeça (olhai os seus retratos nas molduras). Laçavam de todo o laço, amanuseavam potros, fumavam grossos palheiros de bom fumo e amavam seus cavalos que rompiam ventos e bandeavam arroios como um barco ágil. Usavam lenços sob a barba espessa e o barbicacho lhes prendia ao queixo sombreiros negros para a chuva e sóis. Palas de seda para as soalheiras, ponchos de lá quando a invernia vinha. Tinham impérios de flechilha e trevo e famílias de bois no seu império. E eram marcas de fogo os seus brasões. Charlavam de potreadas e mulheres, de episódios de adaga contra adaga, do tempo, das doenças, das mercâncias de gado gordo para os saladeiros. Tinham homens a seu mando, os avós. No quartel rude dos galpões campeiros - enseivados de mate e carne gorda - os empíricos soldados madrugavam na luz das labaredas de espinilho que era sempre o primeiro sol de cada dia. Honravam os avós a cor dos lenços: - a seda branca dos republicanos, o colorado dos federalistas. E morriam por eles, se preciso, - coronéis de milícias bombachudas acordando tambores nos varzedos no bate casco das cavalarias. Nas largas camas de cambraias alvas vestindo o corpo da mulher mocita, juntavam carnes no silêncio escuro pautado por suspiros que morriam no contraponto musical dos grilos... Os avós eram de carne e osso. Tinham braços e pernas e cabeça, artérias, nervos, coração e alma. Humanos como nós, os velhos tauras, mas de bronze e de ferro nos parecem esses campeiros que fizeram história. Estátuas vivas de perenidade nos pedestais do tempo e da memória.