Domingo a tarde remoído de cansaço Pus a rede no terraço E balançando adormeci Talvez puxado pelo laço da saudade Sonhei deixando a cidade E voltando onde eu nasci Entre a ramagem maqueada de poeira Pela estrada boiadeira Eu cheguei ao pôr-do-sol Eu fui pisando sobre a relva verdejante Eu senti por um instante Pisar no verde lençol Eu vi o gado ruminando na envernada Ouvi um pio na palhada Do Inhambu-Xororó Vi a paineira, o curral e o mangueirão Vi o velho carretão Já encoberto de cipó Vi as abelhas revoando num enxame Entre a cerca de arame Vi a nascente da mina Lavei o rosto e bebi água com as mãos Contemplando a perfeição Da natureza divina Vi meu cavalo relinchar na estribaria Dos guardados que um dia Eu deixei no velho baú Vi barrigueira, chinchador e travessão Que eu mesmo fiz a mão Com sedenho de couro cru Vi o chapéu, o par de botas e a sineta Uma espora sem roseta Que eu quebrei no rodeio Eu vi o laço, o berrante e a guaiaca Protegidos pela capa Pendurados no esteio Eu vi mamãe com o vestido de bola E papai com a viola De cravelhas de madeira Neste momento eu acordei tão tristonho E revivendo o meu sonho Eu chorei a noite inteira Tudo que eu vi sei que não reverei mais Porque ao perder meus pais Para tudo disse adeus Mas não lamento meu sofrimento profundo Porque tudo neste mundo É por vontade de Deus