Desde o ventre materno Somos modelados pelos serial killers Do topo da pirâmide para viver a infância em situação de risco Acompanhada da subnutrição Da negligência estatal e da desestruturação familiar Desde o ventre materno somos modelados pelos assassinos sociais Para viver a adolescência abaixo da linha da indigência, regada a abandono Pólvora, armas de grosso calibre, tortura policial, tabaco Bebida alcoólica, maconha, crack, cocaína e medidas socioeducativas Desde o ventre materno, somos modelados pela playbozada tirânica Para viver a fase adulta marcada pela mendicância Pelos salários estratégicos, pelas matrículas prisionais E as depressões em consequência das perdas violentas Dia após dia em nosso desenvolvimento Vamos sendo programados através da educação Da política, da indústria de consumo e dos meios de comunicação Para sermos os robôs que aceitam com naturalidade a violação do estatuto da criança e do adolescente Da Constituição Federal, das leis de execuções penais e da declaração de Direitos Humanos Vamos sendo programados para sermos as cobaias que não pensam de forma independente Que só expressam opiniões e desejos pré-fabricados por inimigos Um milésimo após o nascimento no vale da segregação Nosso status de humano é reduzido a condição de produto descartável Com prazo de validade de 15 a 24 anos, nos confeccionam para atender as expectativas do escravizador Para repassar sua nine-nine para empunhar sua ponto 30 Para encerar suas McLaren para matar ou morrer pela marca esportiva Que explora e discrimina o nosso próprio povo Para sorrir diante da progamação televisiva e racista e genocida Para transformar iguais em rivais e converter comunidades pobres em praças de guerra Quanto mais sangue, mais audiência para a televisão Mais filhos da puta eleitos, mais dinheiro para a indústria do medo Para a indústria funerária, mais lucro para medicina de guerra exercidas nos hospitais públicos Mais unidades carcerárias inauguradas Mais lotes de armas e viaturas entregues, mais abono salarial pra PM Pra Civil, pra Delegado, mais bens e propriedades pro Advogado, promotor e juiz Quanto mais desinformação, menos motivo para a revolta Mais conformismo com a favelização, com a miséria epidêmica Com as migalhas do assistencialismo Com o aprisionamento em massa da população carente Com as cracolândias, com os esquadrões da morte da polícia Com o modelo governamental de pacificação que produz anualmente A cifra de quase 60 mil atestados de óbito Os vereditos parciais não são por acaso, os enterros coletivos na periferia não são por acaso Os analfabetos funcionais não são por acaso As crianças soldado não são por acaso As crianças prostituídas não são por acaso A concentração de renda não é por acaso A política em prol de financiadores de campanha não é por acaso Cada pormenor hediondo do nosso massacre foi previamente milimetricamente arquitetado Pelos carniceiros da elite, pelos carniceiros descerebrados Que no lugar de investir numa sociedade justa e igualitária Preferem vegetar em casulos de ignorância 24 horas por dia Preferem definhar atrás de escoltas de guardas empresariais e estupidamente Desfrutar de uma segurança ilusória com o rabo repleto de chips subcutâneos anti-sequestros Podemos incendiar ônibus, mandar o comércio abaixar as portas, fazer rebeliões em presídios Fazer passeatas contra o estado genocida E até metralhar gambés em retaliação às chacinas diárias promovidas por policiais de touca ninja Que mesmo assim a produção em série das nossas lágrimas jamais será cessada Enquanto o favelado não enxergar a maquinação burguesa Que mói impiedosamente a carne dos excluídos Homens e mulheres serão asfixiados no transporte de presos Corpos continuarão amontoados nas gavetas de rabecões Mortos seguiram empilhados em quintais de instituto médico legais Pessoas devido à quantidade de melanina e condição social Ainda terão seus nomes escritos em autos de resistência fúnebres Enquanto o favelado não acordar da hipnose da classe dominante E passar a odiar seus algozes e passar a cobrar aquilo que é seu por direito Continuaremos sendo matéria-prima da mais produtiva estatal Continuaremos sendo a matéria-prima da fantástica fábrica de cadáver