Do que me vale fugir? Da morte, da dor, da fome, do perigo? Do que me valerá fugir meu amigo? Jamais poderei fugir, porque me levo comigo Levo os sonhos adiados, esperanças dilaceradas Levo o suor de um povo que trabalha e não tem nada Levo a frustração, estou partindo agora Levo a tristeza de ter nascido num país Onde a liberdade é defendida com discursos e atacada com metralhadoras Levo a fome, levo a vergonha, levo a nudez Levo a hipocrisia, levo também a estupidez Como dois e dois são quatro sei que a vida vale a pena Embora o pão seja caro e a liberdade tão pequena Vou em busca da revolução como Nito Alves quis Conquistar a todos O direito não somente ao pão Mas a poesia e então serei feliz Quando fracos e desencorajados levantarem suas cabeças E deixarem de acreditar na força dos seus opressores Acreditar é muito mais simples do que pensar É por isso que existem mais crentes do que pensadores O crente apenas crê sem analisar Estou partindo agora, seguindo as pegadas de um sonho sem fim Para um lugar distante chamado dentro de mim Vou buscar a liberdade que o sonho humano alimenta Não há ninguém que explique e ninguém que não o entenda Vou em busca Vou sair agora Não levo malas comigo Apenas o sonho me aguarda lá fora Vou entender as flores, os pássaros a namorar Vou ver o céu a falar a linguagem do mar O ilhéu, a rosa, o silêncio cantar em prosa Pareço fora de mim? Não sou apenas uma sílaba silenciosa Eu sou os versos que compõe a poesia do poeta A caneta que não que não se escreve quando a frase não é certa Eu sou o sopro da mudança na luta fervorosa No fundo eu sou, uma silaba silenciosa Mas do que me valerá fugir então? Da morte, da dor, da fome do perigo? Não há espaço para fuga não! Quando a tua hipocrisia é o teu maior inimigo Quando os ventos da mudança devastam as tuas certezas E o impendem de enfrentar as armas, e dizer com firmeza Que já não mais sentarei a vossa mesa Para comer do vosso pão e beber da vossa água Sem fingir que no lugar do coração carrego larvas E uma tristeza que me devora por dentro Que transforma em utopia a honestidade e o bom senso A mísera existência do jovem e da criança Do mais velho já sem esperança No planeta azul e no homem que o habita Na beleza da poesia e na ciência política Deixai-me partir e travar o meu combate Deixai que eu me entregue aos caprichos da arte Vou em busca de uma saída Que me conduza ao elixir de uma longa vida E me ensine alquimia Para transformar lágrimas em oásis de liberdade Para que com esta via Morra em mim o covarde A voz que se cala, os punhos sem manifesto Com medo da bala que cala os gritos de protesto Descobri que de nada me valerá fugir afinal Nem de quem ontem era consciente e hoje é comercial As rosas mortas não impedem o chegar da primavera Quando se é um autêntico profeta para a sua era Quando o silêncio, a indiferença e a passividade Nada mais são se não o ópio da sociedade Que emerge á margem da usura e do peculato Entre o luxo e a ostentação está a fronteira do asfalto Do do que me valerá fugir afinal? Da morte, da dor, da fome, dos meus amigos? De nada me valerá fugir meu irmão Já mais poderei fingir Porque ainda me carrego comigo Eu sou os versos que compõe a poesia do poeta A caneta que não que não se escreve quando a frase não é certa Eu sou o sopro da mudança na luta fervorosa No fundo eu sou, uma silaba silenciosa