Entrou no Prédio com a cara lavada Porteiro nem sorriu, só deu a levantada No Portão automático do seu condomínio Onde cada vizinho é um estranho anônimo Estacionou no escuro do subsolo apertado Com cheiro de diesel, de dívida e pecado Suspirou com a alma cansada demais Mas fez tudo o que mandaram, não errou jamais Mas a felicidade... Nunca veio no manual da imobiliária Elevador sobe cheio de perfume importado De madame católica com poodle empanturrado Tem fitness fedendo a whey e burguesia de opinião Falando de Lula, de canabidiol e de corrupção E ele ali, todo certinho, no meio da ascensão Sem grito, sem fumo, sem ereção Trabalha feito boi, mas não goza da vida Tem tudo que quer, menos saída E o pior pagou 2 milhões pra ouvir o vizinho peidar no 503 Mas no bar tem samba, no bar tem cerveja No bar tem sorriso e olhar que corteja E ele ali, feito apóstolo do pudor Sufocado de fé, mas morrendo de dor Tem carro, tem casa, tem dízimo e pressão Mas não tem prazer nem perdão Comprou a felicidade com cartão E levou um boleto na mão! No bar, um boêmio com violão na mão Cantava Geraldo com paixão E trocava olhar com a dama do copo E cada gole... Era um sopro Ela sorria com os olhos, lambia a espuma E ele ali, na calçada, preso na bruma Com um milhão de dívidas e nenhuma razão Pra continuar sendo santo sem salvação Até o diabo cansou de tentar esse homem Ele se auto condena com recibo e contracheque Mas no céu dele, só tem prestação E a mulher que dorme no outro colchão Já não o beija, só divide o salão Da vida que não toca mais refrão Ele abaixa a cabeça, dá dois giros na chave Entra no lar que parece uma caverna suave E pensa... Essa cruz eu mesmo paguei à vista Que inferno moderno! Que alma Batista Ele tem tudo… Menos vontade de viver