Meu nome é Carlos Augusto Migliaccio Também conhecido como Migli, apelido que minha mãe me deu Depois que eu presenciei a violência dentro de casa Uma boa parte do meu coração morreu Por um lado, tudo tava bem mais cinza E por outro lado, eu comecei a me importar menos com tudo isso O fato de eu me importar menos fez meu ensino médio menos doloroso Eu até consegui fazer alguns colegas Porém, ainda me cortava com muita frequência Eu poderia contar todos os detalhes da minha vida pra vocês Cada lágrima, cada choro, cada desilusão Porém, irei contar sobre o dia 17 de agosto de 2012 Uma festa que mudou minha vida e me colocou no fundo do poço Essa é a Carta N° 3 Sempre me perguntei como eu vim parar no fundo do poço Meus cortes no braço me dizem que a vida que eu levo tá osso Sempre me perguntei como eu vim parar no fundo do poço Meus cortes no braço me dizem que a vida que eu levo tá osso Já não falava com meu pai à um tempo Quando falava era somente sobre o necessário Ele sempre tava pior, dobrou a cachaça em casa E adicionou palavras ruins pro seu vocabulário No terceiro ano a escola melhorou um pouco Não tinha amigos, mas fiz alguns colegas O bullying continuava só que mais leve Eu tava um pouco mais feliz sobrevivendo às cegas Fiquei sabendo de uma festa de uma mina de outra escola Gente desconhecida, podia ser daora Era os 18 dela, ia gente mais velha E eu tava precisando de umas companhias novas Sabia que meu pai nunca deixaria Por isso já tinha um tempo que eu mentia Enquanto ele bebia eu saia pela janela Voltava antes de amanhecer, ele nunca percebia No dia da festa me arrumei bonito Jeans, manga comprida pra esconder os corte Passei no posto pra comprar uma catu Um maço de Lucky Strike e uma garrafa de corote Entrei na festa, vi uma cena comum Menor embriagado era só o que não faltava Muita maconha e geral beijando na boca De certa forma, essa cena sempre me acalmava Quando via a desordem na vida duzôtro Achava a minha desordem um pouco mais aceitável Sentia que eu não era o único fudido Então no meio dos fudido eu não seria indesejado Sempre me perguntei como eu vim parar no fundo do poço A falta de amigos dizia que a vida que eu levo era osso Sempre me perguntei como eu vim parar no fundo do poço A falta de amigos dizia que a vida que eu levo era osso Em meio à festa vi uma mina de canto Com olhar de melancolia, mas tinha certo encanto Percebi que me encarava Como se soubesse que nossa amargura se assemelhava um tanto Ela era a única menina de manga comprida Eu era o único menino de manga comprida Quando eu olhei no olho dela Foi como se ouvisse sua voz dizendo: Eu também odeio a vida Pra afastar a timidez bebi um pouco Entre trancos e barrancos consegui puxar assunto Ela era uma pessoa incrível Falava tão pouco, mas dizia muito Seu nome era Bianca Abrão Filha de pais divorciados pela traição Também tinha cortes no pulso e forte pulsação Muita emoção, gerou atração, prendeu minha atenção Lá pras 3 da matina a festa tava vazia Convidei a Bia pra beber lá no quintal Falei que nunca tinha beijado na boca Ela riu e disse que tinha uma ideia legal Ela tava fumando um, me ofereceu um trago Só aceitei porque a presença dela me anima Antes já tinha até fumado uns baseado Mas beck, brisa sempre zuava meu clima Eu tava feliz, a Bia era nota 10 Finalmente alguém que não tinha preconceito Tava um dia perfeito E ela perguntou se eu queria me divertir, pois conhecia um jeito Claro que eu respondi que sim Na mesma hora ela tirou do bolso um ziplock com um pózinho branco Enrolou uma nota e esticou no banco E disse que se eu experimentasse iria me alegrar um tanto Aquela cena bugou minha mente Como assim? Cocaína, droga do diabo e dos doente Droga de gente acabada no fundo do poço Gente sem passado, sem futuro e sem presente Porém a Bia não era nada disso, bem pelo contrário Parecia muito inteligente, um belo sorriso eloquente Aparência saudável, ainda era muito atraente Pera, pausa a história Nesse momento eu tive um dos piores pensamentos da minha vida As pessoas que sempre me disseram que cocaína era uma droga horrível Foram as mesmas pessoas que me trataram como uma droga horrível Que me fuderam, nunca me deram atenção, carinho, nem nada A Bia, por outro lado, cheirava cocaína e me tratou super bem Não me excluiu, não me expulsou, não me agrediu Caralho será que eu sempre vi o mundo de cabeça pra baixo? Sempre fiz tudo que disseram que era certo e deu tudo errado E se eu fizer ao contrário, e se eu fizer ao contrário? Naquele momento peguei a nota enrolada Coloquei no nariz e me aproximei do banco Respirei com toda a força que eu tinha E por um segundo minha mente toda ficou em branco Foi a melhor sensação de toda minha vida Nariz ardendo e coração a milhão Como se eu não tivesse nenhum problema, nenhuma decepção Aquela foi a primeira vez que eu me senti vivo Afastou minha apatia e toda depressão A sensação era igualzinha a se cortar Só que multiplicado por um milhão Sempre me perguntei como eu vim parar no fundo do poço O pó no nariz me dizia que a vida que eu levo era osso Sempre me perguntei como eu vim parar no fundo do poço O pó no nariz me dizia que a vida que eu levo era Naquele momento, minha vida mudou Eu encontrei minha segunda paixão: A cocaína Era algo libertador, eu me sentia forte, novo, invencível Eu não me sentia quem eu realmente era: Cicatrizes e lágrimas Dali pra frente a cocaína virou algo presente no meu dia a dia E junto ao hábito de me cortar Curavam quase que qualquer dor que eu tinha Maldita cocaína Se alimentou da minha fraqueza Pra me deixar às margens da sociedade E fui eu que paguei a conta toda, sozinho Até hoje eu me pergunto o que seria de mim Se as escolas falassem sobre drogas de uma forma realista, sincera E não desse jeito sensacionalista Bom, talvez eu não me encontrasse aqui!