Vou abrir o meu diário para ler o inventário Das mazelas mais febris De sequela em sequela, da senzala à favela Nas entranhas do país Muitos fugiam de mim ou me olhavam sem me ver Preconceito marfim que me fez aprender Escapar dos lixões e da submissão Mas não me anulei Do papel que catei fiz abolição E vi que a dor que não sai nos jornais Vem dos meus ancestrais falsamente libertos Pra quem faz papelão de mobília Casa de família é o caminho mais certo Ê canindé, cada um com sua cruz Ê canindé, eu também sou de Jesus Sinto a fome do excluído Sente o gume do facão Vim dar nome ao esquecido Sem registro ou certidão Negro drama Sem nenhum futuro, na terra batida É a trama, os murros e muros, cidade partida A grana nos condomínios e seus perdulários Pelo domínio de mais proletários A desigualdade é a chama da inquietação Tijuca dá lugar de fala a um quarto de despejo A letra retinta tornou-se lampejo Traz escrevivências pra denunciar A dor de quem tem fome É o desprezo de quem come Só quem viveu pra contar (Carolina) Maria de Jesus e dos brasis Não há amarra que vá nos fazer parar Um livro aberto fala mais que mil fuzis Abre a porta social pro meu Borel entrar