Sem tempo para ter tempo De ter tempo de te dar O tempo que tu mereces Prazeres para que tu morresses Manhãs que tu não amanheces E arrepios que estremeces Na boca de te beijar Fico sentado no quarto, nesta cama de pensão Ausente do espirro farto, cansado dessas mulheres Que ouvem sem me esgotar Que me olham sem me ver, que me amam sem saber Que me roçam sem tocar Que me abraçam sem paixão, que ignoram que eu anoiteço Que me ensombro, que escureço Que me enrugo e envelheço, me pregueio e apodreço E a quem pago o que me dão Uma espécie de ternura, uma imitação do amor Lençóis que são sepultura De carícias sem doçura E dos meus lábios sem cor Ai dedos no meu cabelo, quero a minha raiva toda Quero domá-la e vencê-la Quero vivê-la a meu modo Até encontrar por fim aquela voz de menino Há tantos anos perdida, há tanto tempo esquecida Em soluços dissolvida A gritar dentro de mim, a gritar dentro de mim A gritar dentro de mim