Sou verso solto na dobra do tempo
Rasgando o silêncio com doce lamento
Na dança da brisa que afaga o cimento
Sonho acordado num breve momento
Espelho quebrado reflete universo
Em cada estilhaço um poema disperso
O caos é harmônico, quase subverso
No peito, um abismo de canto reverso
E se eu for só fresta do infinito
Luz que escapa, mesmo em grito aflito
Me despeço do que nunca dito
E abraço o mundo no que acredito
Carrego perguntas no bolso rasgado
Respostas me fogem num tom disfarçado
Sou verbo no cio, desejo alado
Nas entrelinhas do não-declarado
Faço da dor um bilhete encantado
Do riso, um abrigo improvisado
E sigo, ainda que despedaçado
Com alma em festa e corpo cansado
E se eu for só fresta do infinito
Luz que escapa, mesmo em grito aflito
Me despeço do que nunca dito
E abraço o mundo no que acredito
Não me contenha em moldura ou muro
Sou tempestade no traço mais puro
Entre o delírio e o sonho mais duro
Habita em mim o futuro inseguro
No trapézio dos dias, me jogo sem medo
Não por coragem, mas por segredo
Porque viver é poema sem enredo
E amar é se despir sem degredo
E se eu for só fresta do infinito
Deixa que a luz me tome por escrito
Não peço paz, mas sim um conflito
Que me transforme em algo bonito